terça-feira, 18 de outubro de 2011

VLADIMIR SAFATLE Inflação de prestígio "Enquanto eu cobrava R$ 100 por sessão, tinha poucos pacientes. Quando comecei a cobrar R$ 200, por incrível que pareça, os pacientes afloraram." Esta afirmação de um amigo psicanalista talvez valha um capítulo na teoria geral da formação de preços, ao menos no Brasil. A mudança no preço de sua sessão não foi o resultado de alguma nova conformação das dinâmicas de oferta e de procura. Ela foi, na verdade, a descoberta de que, em países com alta concentração de renda, certas pessoas estão dispostas a pagar mais simplesmente devido à crença de que as coisas caras foram feitas para ela. Por mais que economistas gostem de dizer o contrário, a ação econômica é baseada em sistemas de crenças e expectativas cuja racionalidade é fundada em fortes disposições psicológicas "irracionais"-pois estão ligadas a fantasias. Atualmente, alguns dos aluguéis mais caros do mundo podem ser encontrados em cidades improváveis como, São Paulo, Moscou e Luanda (capital angolana). A razão é que tais sociedades emergentes crescem com alta desigualdade de renda, o que faz com que uma parcela mínima da população, com poder aquisitivo exorbitante, puxe para cima a cadeia de preços. Para o resto da população, melhor seria que essa parcela simplesmente não existisse. Qualquer pessoa que frequenta restaurantes nessas cidades percebe que a disparada de preços pouco tem a ver com a flutuação do valor dos alimentos. Nossos agricultores continuam recebendo, em larga medida, valores irrisórios. Tal disparada vem da existência de pessoas que não sentem diferença entre pagar R$ 30 ou R$ 70 por um prato. Mobilizando a crença de que as coisas caras são exclusivas, elas geram, assim, um forte problema econômico. Há de perguntar-se por que, sendo a inflação uma questão tão premente na vida nacional, nunca encontramos reflexões sobre a relação, aparentemente tão evidente, entre pressão inflacionária e desigualdade social. Ao contrário, vê-se apenas pessoas dispostas a falar contra os "gastos públicos", isto em um país onde, vejam só vocês, escolas e saúde pública são subfinanciadas e grandes investimentos públicos em infraestrutura são urgentes. Talvez um dia descobriremos que a economia brasileira só estará mais bem defendida contra a inflação quando a desigualdade e o consumo conspícuos que ela gera forem realmente combatidos. O que é melhor do que reduzir os mecanismos de controle da pressão inflacionária à definição de taxas de juros, pois a disparidade de renda, além de gerar fratura social e conflito de classe, é fator de instabilidade econômica. VLADIMIR SAFATLE escreve às terças-feiras nesta coluna.

sábado, 8 de outubro de 2011

A máfia dos Valets da Vila Madalena

Blitz em valets expõe loteamento ilegal das ruas da Vila Madalena REYNALDO TUROLLO JR. ANDRÉ CARAMANTE DE SÃO PAULO Uma operação policial contra valets ilegais causou rebuliço ontem no agitado bairro boêmio da Vila Madalena, na zona oeste de São Paulo. Oito pessoas ligadas aos serviços de manobrista que atendem a bares e restaurantes da região foram detidas para prestar esclarecimentos. Duas permanecem na prisão. A blitz chegou a flagrar um manobrista de valet que não tinha carteira de habilitação. A espera para ter os carros devolvidos irritou clientes. Alguns ameaçavam "chamar a polícia", mas eram logo avisados de que a demora era causada justamente por uma operação policial. Exaltada, uma mulher foi ser presa por desacato e liberada depois. De acordo com os policiais, os valets garantiam aos clientes -por escrito nos tíquetes- que guardavam os carros em local fechado e com seguro, mas, na verdade, deixavam os veículos na rua. As investigações indicam que as empresas reservavam vagas nas ruas com cones e faixas, proibindo moradores e comerciantes de estacionar em frente a seus imóveis. As reservas de vagas eram feitas à tarde e só eram ocupadas pelos valets à noite. O preço do serviço no bairro varia de R$ 15 a R$ 20. ENVOLVIDOS A blitz mirou o serviço em seis bares da rua Aspicuelta e de vias perpendiculares. Todos -Posto 6, Salve Jorge, Prima, José Menino, Filial e Santa Gula- dispunham de serviços terceirizados ilegais. A polícia ainda não sabe se os donos dos bares eram coniventes com o modo de operar das empresas. Os contratos entre os bares e os valets agora serão analisados. "Esse pessoal [dos valets] age como gangue ao intimidar os moradores", diz o delegado Osvaldo Gonçalves. "A via pública está loteada." O entorno da praça Senador Lineu Prestes e a altura do número 130 da Aspicuelta eram os principais bolsões onde carros eram deixados. "O uso irregular do espaço público, corroborado pelo engano à vítima e pela obtenção de vantagem, configurou o estelionato", afirma o delegado Aloisio Araújo. Apenas o dono de um valet foi identificado até agora. Eriton Goiabeira de Souza, dono da G5 Estacionamento, está preso. A polícia disse que, até ontem, Souza não tinha advogado. Além dele, um manobrista permanece detido, mas por outro motivo: ele era procurado por dever pensão alimentícia à ex-mulher. Os outros detidos foram liberados após serem ouvidos apenas como testemunhas. TROCAS O bar Filial informou estar providenciando a troca da empresa de valet. Os bares Posto 6, Salve Jorge e Prima informaram que não tinham conhecimento das irregularidades e vão tomar providências quanto ao serviço. O bar José Menino informou que os carros entregues à sua porta são colocados, sim, em estacionamentos. Os representantes do estabelecimento admitiram que um dos manobristas não tinha carteira de habilitação. Segundo a polícia, a operação deve ser estendida a bares de bairros como Vila Olímpia, Itaim e Tatuapé.